Há muitas décadas que a cobertura jornalística que a
televisão dá a estilos musicais e seus seguidores é caracterizada por duas
infelizes frentes: a superficialidade e o estereótipo. Recentemente o programa “A
Liga”, da TV Bandeirantes, exibiu uma matéria onde cobria quatro diferentes segmentos
do universo musical brasileiro e focou a linha editorial em seus universos mais
superficiais – as letras pornográficas do funk, a bebedeira e pegação do
sertanejo (universitário – arrocha, etc), a simplicidade marginal do rap e a
agressividade dos shows de rock (ali representado por uma banda metalcore).
Não entrando no mérito de funk, rap e sertanejo (segmentos aos
quais não sou sequer simpático, por isso desconheço os detalhes de sua
cultura), os atos apresentados para os consumidores de rock comprovaram
infelizmente o que eu previa antes de assistir a tal programa: uma visão
popularesca e por vezes enfatizando e pressupondo comportamentos bizarros.
Vamos aos fatos dissecados. Sempre aquela mesma coisa de padronizar fãs de rock
e metal como se TODOS usassem piercings, tatuagens e trajes de cor preta, como
se isso fosse obrigação ou qualificação para uma pessoa ser mais ou menos culta
no estilo. No festival onde a matéria foi feita, a banda em destaque era a
Project 46. Na passagem do som o apresentador Thaíde apenas mostrou a faceta
gutural do desempenho do vocalista. E no show apenas a “roda de agito” que os
fãs fazem no meio do público. Sequer mostrou o nome de uma música, sequer
questionou os membros sobre suas influências, ou mesmo como foi a experiência
de ter se apresentado no festival “Monsters of Rock”.
Chegará um dia em que eu verei uma cobertura jornalística a
cerca de rock, que enfatize sua complexa conjuntura de fatores para levar a
cabo sua execução: muito estudo, bons equipamentos, conhecimentos de arranjos,
efeitos, amplificação, ensaios feitos até a exaustão, e sua sobrevivência no
mercado underground do showbizz, vivendo fora da mídia mercadológica (aqui não
me refiro ao happy-rock de MTV de nomes como Fresno, CPM22, etc). Num campo
agora confessamente comparativo, tem as dificuldades que outros estilos não têm
e ao mesmo tempo carrega consigo um universo técnico muito mais elaborado e que
exige muito mais educação musical e dedicação dos instrumentistas envolvidos
que outros tipos de música.
Além do item superficialidade, a aplicação dos estereótipos
baratos chega a ser irritante.
Quem disse que todo show de rock/metal é a mesma coisa? Quem
disse que todo fã do estilo se comporta, se veste, enxerga e consome a música
do mesmo jeito? Saindo da aura do rock, prefiro acreditar que existam também
outros consumidores de funk ou sertanejo que também frequentem shows desse tipo
que não estão ali apenas para beijar 30 pessoas, mostrar as suas partes íntimas
em público ou cair de tanta bebida consumida. O que sugiro refletir neste
artigo não é exatamente a preferência musical, mas a maneira com a mídia
utiliza-se de intenções popularescas com o suposto intuito de mostrar o
universo que envolve cada segmento. Mas talvez essa seja a ideia, afinal porque
mostrar uma faceta cultural ao povo, quando se pode abusar de bizarrices e
fatos degradantes, pois num país onde reality shows, novelas e programas de
auditório são “mais interessantes” do que discutir e conhecer problemas sociais
e políticos, programas popularescos serão sempre a estratégia comercial favorita
da grande mídia.