Em janeiro próximo (2015) vão se completar 30 anos da
primeira edição do festival “Rock in Rio“, que aconteceu na capital carioca
entre 11 e 20 de janeiro de 1985. Logo aparecerão dezenas de matérias e
artigos, nas mídias oficiais e amadoras sobre tal comemoração, então não
gostaria de ter nesse (breve) relato os dados apenas informativos. Quem naquela
época começava a respirar o rock no Brasil sabia das galácticas dificuldades de
se ter acesso a bandas e informações. O Brasil estava se desvencilhando de um
panorama político comandado por quase duas décadas de chumbo, onde a liberdade
artística (em qualquer área) era controlada com rigor pelo poder militar. O
pop-rock brasileiro começava a frequentar rádios e programas de TV, em nomes
como Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, Barão Vermelho e asseclas. O
rock-bruto e prog-rock de grupos da década anterior passavam como meros
desconhecidos do grande público (Secos, O Terço, Made in Brazil, Casa das
Máquinas, Som Nosso, etc), relegado apenas a afortunados que tinham contato com
aquela cena.
No segundo semestre de 1984, a senhora Rede Globo anunciava
um grande festival de rock no país, e estampava em seus intervalos comerciais
gente como Queen, Iron Maiden, Scorpions, Yes, AC/DC, Ozzy. Era um sonho, algo
surreal para garotos que, como eu, começavam a consumir aquelas bandas. Algumas
publicações enxertavam as bancas de revistas com biografias e matérias de tais
grupos, alimentando ainda mais o conhecimento e ansiedade daquela geração de
rockers, que se recusou a aceitar que o pop-rock nacional tão em voga era o que
melhor o mundo do entretenimento podia lhes oferecer.
Uma das características que gerou polêmica, revolta e
gozação foi o fato de que, um festival que levava o termo “rock” no nome, trazia
em seu cast artistas de música pop, regional e MPB, característica essa que se
repetiu nas edições que ocorreram nos próximos trinta anos. Quando adolescente
sentia-se a revolta de ver nomes como Erasmo Carlos, Eduardo Dusek, Alceu Valença,
Elba Ramalho e até mesmo artistas internacionais como All Jarreou, James Taylor
e Nina Hagen.
Hoje, malhados com a sabedoria do tempo, vimos que aquilo sempre
foi uma estratégia comercial, que, mesmo aborrecendo até hoje a geração de
jovens rockers, permitiu que o Brasil recebesse gigantescas formações do rock
mundial, entre rock clássico, hard rock e heavy metal.
Após a realização desse festival, o país, aliado a uma brisa
fresca de democracia que se respirava em toda parte, passou a ser rota
internacional de médias e grandes bandas. Centenas de discos (antigos e novos)
foram lançados no mercado fonográfico local. Milhares de novos grupos foram
formados, inspirados pela força de exposição daqueles shows. Alguns podem
discordar, mas o rock tupiniquim era um antes do Rock in Rio e foi outro
depois.
A Rede Globo transmitiu quase todos os shows, coisa rara se
imaginarmos os padrões popularescos de hoje em dia. Ver um Iron Maiden no ápice
da “World Slavery Tour”, um Queen que reinava no showbiss há muitos anos, um
Ozzy (que a despeito da condição física desfavorável) com seu sempre fantástico
repertório, um Scorpions totalmente desconhecido por aqui, mas que realizou
shows enérgicos e inesquecíveis, o Whitesnake, que veio substituindo o Def
Leppard (pelo acidente com seu baterista, que lhe custou um braço), fez
apresentações memoráveis e um AC/DC que sempre conquistou qualquer público com
seu hard visceral, foram momentos que inspiraram toda uma geração e trouxeram
mudanças na orientação e aceitação da música rock no país.
Era uma época de ingenuidade, sonhos, ideologia para aquela
geração. Anos depois, muitas bandas que se formaram naquela época varreram o
mundo. Várias outras edições ocorreram, sempre trazendo os nomes mais bem
sucedidos de suas épocas, mas quem vivenciou aqueles dez dias, mesmo aqueles
que não puderam estar presentes na Cidade do Rock, construída especialmente
para evento, pode atestar o impacto e a importância de tal evento no
desenvolver de sua paixão pela arte do rock, seja como consumidor,
colecionador, produtor ou músico.