O heavy metal chegou ao
Brasil no começo dos anos 1980. Muita gente que ouvia rock clássico de Beatles,
Stones, Led Zeppelin, The Who, Floyd, Deep Purple e Black Sabbath (o mais
pesado da turma) começava a ter contato com uma música pesada, rápida e
melódica, em nomes como Iron Maiden, Judas Priest, Saxon, Motorhead, Accept,
Mercyful Fate, Venom. Jovens que, a partir de cerca de 15 anos, começava a
enxergar beleza sonora em música mais agressiva e impactante. O visual, que
mesmclava cabelos compridos, calça jeans surrada, camisetas pretas e braceletes,
chocava e impressionava uma sociedade até então com resquícios do
conservadorismo de décadas atrás.
Esses mesmos jovens passaram
pela década de 1980, admirando outros estilos ainda mais enérgicos que surgiam
dentro da família heavy metal, como Thrash Metal, Death Metal, Doom Metal.
Nomes como Metallica, Slayer, Exodus, Kreator, Destruction, Morbid Angel (sem
citar nomes mais “cult” dentro do undergroud)
conquistaram a afeição de boa parte dos amantes de heavy metal na
segunda metade daquela década. Bandas agressivas se formavam aos cântaros e
várias partes do país. O advento do primeiro Rock in Rio em 1985, com nomes
como Ozzy, AC/DC, Iron Maiden, Scorpions e Whitesnake (em que pese algumas
delas praticarem hard-rock - tudo era considerado “rock pesado”) popularizou
ainda mais no Brasil a aceitação e a procura pelo heavy metal. E nos anos 1990
ainda surgiram outros sub-estilos como o metal melódico e o prog-metal, que
continuaram a angariar apreciadores mundo afora.
Pois bem. Aqueles
adolescentes entre 15 e 18 anos, que nos anos 1980 se entregaram à idolatria da
música pesada estão hoje, em 2014, numa faixa de idade entre 45 e 50 anos. Ou
seja, o tempo passou, lá se foram mais de 30 anos. Quem vive o universo do rock
sabe que muita gente apenas “passa” pelo estilo. Quando novas fases da vida
chegam, ele fica no passado. Mas considerando que muitos daqueles moleques
tiverem a paixão pela música metal enraizada em suas veias, é bem compreensível
que deverão consumi-la até o último estágio de suas velhices.
É nesse cenário que eu, e
muita gente que pertenceu aquele grupo, se encontra hoje. Vieram as faculdades,
as namoradas, os casamentos, os filhos, os empregos, os negócios, as
dificuldades, os crescimentos sociais e econômicos. Mas o amor verdadeiro pelo
heavy metal continuou acompanhando nosso dia-a-dia. Continuamos vendo shows,
conhecendo novas bandas, acompanhando notícias, mudanças, declínios e retomadas
de grandes nomes. É uma cultura, envolta num universo de informação, que com a
massificação da internet tornou-se ainda mais intensa.
De qualquer forma, somo
pessoas iguais a quaisquer outras. Trabalhamos, construímos famílias,
convivemos socialmente com pessoas de diferentes gostos e níveis culturais.
Mas, quando tiramos um tempo para apreciarmos músicas, sempre revisitamos o
nosso bom e (hoje) velho heavy metal. Muita gente que lê isso sabe que talvez,
seus pais, suas esposas, seus filhos não entendem como podemos ter tanto prazer
ao ouvir uma música tão agressiva e inacessível a ouvidos externos. Não
entendem como é ver maravilha em riffs tão rápidos, baterias tão forte,
vocalizações tão altas e letras tão transgressoras. Talvez nunca entenderão.
Mas isso não nos faz pessoas melhores, piores, mais ou menos competentes,
atenciosas, amorosas, sem foco nem objetivos na vida.
Evidentemente que já passou
por nossas cabeças sermos discriminados, sermos preteridos, não termos
credibilidade no quesito “cidadão de moral e idoneidade”. Mas não há problemas.
O problema está em quem nos enxerga de forma diferente. Vamos considerar: Ozzy
Osbourne tem 65 anos, Rob Halford tem 63, Steve Harris tem 58, James Hetfield
tem 51. No Brasil, gente de bandas como Sepultura, Korzus, Dr. Sin, Taurus,
Dorsal Atlântica, Ratos de Porão, tem mais de 40 anos e estão por aí fazendo
música.
Pessoas envolvidas na
produção de música (bandas, estúdios, lojas, shows) vivem num universo marginal
no mercado da música no país, produzindo-a muitas vezes de forma muito mais
ideológica do que mercadológica. Mas eu estou falando do consumidor de heavy
metal, que tem suas prioridades profissionais bem longe do universo musical.
Pessoas que se apegam na música metal como sendo seu refúgio, seu divã, sua
válvula de escape em relação aos problemas de incertezas de nosso cotidiano.
Seremos talvez sempre
incompreendidos, não estamos no âmago da produção musical e levamos nossa vida
junto ao padrão social comum de todo mundo, como se suportássemos as condições
de sobrevivência social e econômica pra termos nossas boas horas juntos a
nossos CDs e DVDs.
Pelo menos onde vivo, quando
conversamos com gente de 60 pra cima, difícil encontrar quem conhece a fundo a
cultura do rock dos 1960. Ouvir Beatles é fácil. Difícil e conhecer músicas
como “Blackbird” ou "Octupu's Gaden", e difícil é
ouvir desses mesmos caras admitir que conhecem discos “Band of the Run” ou “Venus
and Mars”, do Wings. Agora, eu acho meio difícil que daqui há 20 anos, eu não
saiba de cor a discografia do Iron Maiden, por exemplo. Essa é a realidade da
primeira geração de pessoas no Brasil que se apaixonaram por heavy metal. E
quem realmente gosta disso, vai gostar aos 60,70,80, 90.