quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

O fim das grandes bandas: agora uma questão de tempo


Na história da música rock encontramos diversos casos em que o artista interrompeu precocemente sua trajetória, vindo a falecer com pouco tempo de carreira. Diversos e importantes nomes podem ser citados nesse contexto, Jimi Hendrix, Janis Joplin, Keith Moon, Ronnie Van Zant, Brian Jones, Steve Ray Vaughan, Bon Scott, dentre outros. Alguns deles, por excesso de drogas ou álcool, outros por trágicos acidentes. Todos num momento em que suas obras estavam no topo. E podemos deixar nossa imaginação trabalhar para situarmos como estariam suas carreiras se hoje estivessem ainda vivos, e quanta música de qualidade poderia ter sido por eles produzida nas últimas décadas.

Mas também nos deparamos com artistas do rock que encontram seu fim em experiente estágio de idade. Foi assim com BB King, Alvin Lee, John Lord, Johnny Winter, Rich Wright, Dio, Jack Bruce, etc. Tais nomes produziram décadas de inesquecíveis discos e shows.

Mas, em dezembro de 2015, com a morte de Lemmy Kilmister, do Motorhead, nós amantes da música rock iniciamos uma fase com a qual sabíamos que começaria, mas não desejávamos que acontecesse: o fim de grandes bandas pela mortes de seus mentores. Mesmo que Lemmy tenha tido uma vida cercada de excessos, o que pode ter corroído por demais sua condição de saúde, sua passagem aos 70 anos veio para nos avisar que muitas bandas vão encerrar suas carreiras, que ficarão marcadas no tempo como tantas outras que tiveram sua trajetória concluída, como Beatles, Led Zeppelin, Cream, Free, Genesis, dentre outros monstros sagrados.

Nos próximos 10 ou 15 anos isso se repetirá com muita constância. Testemunharemos o enterro de bandas como Deep Purple, Rolling Stones, The Who, Judas Priest, Black Sabbath, AC/DC, Aerosmith, Rush, Scorpions, e outras, bem como de seus principais mentores. É a força to tempo atuante sobre uma arte que gera grupos com 40 e 50 anos de carreira. Algumas versões atuais (e discutíveis) enxertadas de membros novos (como o caso do atual Queen), poderão ainda assinar sua carreira com o nome de batismo da banda, mas isso já é outra história.


Sempre vai haver, dentre o público consumidor, aquela velha e eterna polêmica de que não existem mais grandes bandas geradas nos últimos anos, que a época gloriosa do rock acabou, o novo versus o antigo, etc. Mas a grande reflexão é sobre um fato inevitável: as bandas gigantes, com meio século de atividade, estarão mesmo se extinguindo, mas apenas no tocante da produção de novas músicas e shows. Porque sua obra nunca vai morrer. Se hoje um garoto de 13 anos descobre a obra de uma banda como Blue Cheer, Mountain, MC5, e por ela se apaixona, isso se repetirá pelas décadas vindouras. 

sábado, 2 de maio de 2015

Monster of Rock 2015 – um inesquecível e monstruoso espetáculo

(Crédito: Márcio Felício)

A última edição do festival  “Monsters of Rock” (a sexta realizada no Brasil), que aconteceu durante os dias 25 e 26 de Abril de 2015, em São Paulo (SP) não só se candidata a melhor concepção da história do festival no país, como pode tranquilamente se transformar num dos maiores acontecimentos na epopeia de apresentações internacionais em nosso território. Num ano em que festivais de grande apelo comercial e de mídia, como Lollapalooza e Rock in Rio, esta edição do Monsters já se transformou no maior acontecimento do rock do ano.

A exemplo da edição de 2013, a organização do festival repetiu a fórmula de dois dias seguidos, mas apostou num cast mais caro e mais chamativo. Além disso, conseguiu reunir quase toda a nata do que mais clássico existe do universo hard rock/heavy metal. Ozzy por si só já arrastaria milhares de expectadores, assim como Kiss. Mas talvez a ideia fosse mesmo fazer história. Então, em dois dias em que praticamente oitenta mil pessoas se fizeram presentes ao estacionamento do Anhembi (colado ao Sambódromo), gente de muitos cantos do país puderam se satisfazer com apresentações de várias tendências e estilos que atravessam décadas de musicalidade a serviço da música pesada.

Uma estrutura gigantesca, mesmo a preços “europeus”, serviu de berço para dezenas de milhares de fãs, que se fizeram unidos para vislumbrar grandes, decanas e emblemáticas bandas que despejaram clássicos e contundentes repertórios sobre palcos adornados de potências sonoras e luminosas, que são premissas mínimas de uma grande apoteose de rock ad roll.

O que relato aqui é o que vivenciei no domingo, 26 de março, numa tarde paulistana que foi generosa com os amantes da boa música pesada – um clima ameno, que revezava ácidas aparições de sol com nuvens refrescantes e uma constante ameaça de chuva, que não se atreveu a molhar rostos tão motivados.

Pouco depois do meio dia vem a banda nacional Dr. Phoebes para abrir o evento. De qualquer forma uma oportunidade inescapável de uma banda nacional mostrar seu trabalho. Mas faltou clímax. Faltou ambientação ao tipo de festival. Muita gente aplaudiu, mas convenhamos, talvez alguém com um som mais pesado e direto seria mais contundente.

Depois veio a Steel Panther. Bem profissionais e com boa postura de palco, a banda veio bem representada pela ótima performance vocal de Michael Starr, mas pecou em muitas coisas. Primeiro, brincadeiras ensaiadas e a constante exibição de seios femininos nos telões (e no palco). E muito “fuck off, fuck you everybody, fuck”, fuck de graça a todo momento. Boa levada no conjunto, mas vazio nas mensagens e putaria forçada. Muita banda nacional faria melhor nesse tempo/espaço.
Então o festival começa mesmo com o Malmsteen. Com um sol impiedoso na cara, o grupo entra com bons problemas de som no palco. A estratégia de manter um tecladista como vocalista principal funciona talvez para os comandos de Yngwie. Mas foi pouco. Além disso, o set escolhido privilegiou as performances acrobáticas e técnicas do sueco, o que, na maioria da apresentação, encheu bem o saco. Poderia ter sido mais contundente, pela ocasião e pelo público.

Mas, a próxima atração compensou. O Unisonic, comandando por Michael Kiske e Kai Hansen (pra muitos a grande dupla eterna do Helloween), veio e mandou um show com pegada, alegria e interação com o público. Claro que os números do Helloween fizeram o incêndio daquele meio de tarde, mas a performance de Kiske não teria como não deixar de ser louvada. Tons altos e fortes ecoaram por toda a plateia, fechando com músicas rápidas “March of Time“, “I Want Out” (ambas Helloween) e “Unisonic”.

A seguir, vem aquele que considero o ponto alto do festival. O que poderíamos considerar como um perfeito show de rock? Som de palco padrão FIFA, set list irrepreensível, alegria estampada nas faces dos músicos, interação com o público, iluminação e pegada de palco, execução simétrica das músicas? Tudo funcionou 100% e o Accept conquistou o público com segurança, domínio do show e tradição ao heavy metal clássico da banda, mesclando sucessos do passado com material dos três últimos (e excelentes)  álbuns. Pra cair qualquer queixo e deixar as milhares de pessoas na assistência atônitas por tão ímpar exibição. Pra guardar em nossa metálica memória.

A seguir, seria a vez do Manowar tentar mostrar ao Brasil que poderia apagar a fatídica apresentação no Credicard Hall (SP) em 2010, onde privilegiou material mais novo e frustrou a maioria de seu público. Mas, o que prometia ser uma grande redenção esbarrou infelizmente no quesito estrutura sonora de palco. Não sei se, pelo líder da banda ser Joey de Maio, o som de seu baixo se mostrou muito alto, o que danificou a audição da guitarra. O set foi perfeito, entremeando sons antigos e novos. Até enfiaram Robertinho do Recife durante a “Metal Daze” pra fazer alguns pontinhos com o público. Talvez um nome mais forte na cena metal, funcionaria melhor, como Eduardo Ardanuy por exemplo. Mas as falhas continuaram. Em seu maior clássico “Batlle Hymns”, o grande solo de guitarra simplesmente sumiu na audição e um erro na condução do baixo, fez a pausa vocal se comprometer. O grande destaque do show foi Eric Adams, sempre preciso e forte em suas partes.

Depois era a vez do Judas, com o set esperado e conhecido desde a noite anterior (quando também se apresentou antes do headliner Ozzy). Sem muitas surpresas, a banda mandou seu set pesado, bem definido e revisitando diversas fases da carreira, incluindo cinco temas do último disco de estúdio. Halford , no auge de seus 63 anos, não mostrou falhas na potência e mandou bem em sons com notas impiedosas, tanto que “Painkiller” foi uma das últimas.

E pra encerrar tão fantástica edição veio o Kiss. O que dizer do Kiss. Sempre competentes, mas que trazem consigo o perfeito conceito de show. Não é apenas apresentação musical. É um desfile de grandes clássicos do hard rock dos 70/80, emoldurados pelo carisma história de Paul e Gene, mais o grande e fundamental apelo visual/estético da apresentação. Músicos que voam ou se elevam pelo palco, lasers e iluminação que exibem um conceito visual que encantaria gente que nem mesmo gosta de rock. É, sem ser literal, um espetáculo sonoro e visual. E para aqueles que sintonizam apenas na música, poderiam fechar os olhos e se incorporar praticamente os “Alive I” e “II”. Encerramento perfeito para um dia perfeito de hard rock e heavy metal na capital paulista. Uma noite que entrou para história, tanto do festival “Monsters of Rock”, como para toda epopeia de shows de música pesada no país.


O saldo, mais que maravilhoso, aponta para futuras edições que mostram poder abrigar shows dos maiores headliners do planeta, no quesito música pesada. Gigantes como Maiden, Metallica e AC/DC podem tranquilamente ocupar tal posto. “Monsters of Rock 2015”, quando um cast bem definido encontra uma estrutura de som irrepreensível e que abraça o público com serviços básicos de primeira linha como alimentação, segurança e higiene, é sinal de reconhecido sucesso. Que venham novas edições nos anos seguintes, repetindo esta fórmula. Mas por favor, reprojetem os preços dos insumos, porque, diferente das apresentações sobre o palco, foram um verdadeiro estupro financeiro.

domingo, 15 de março de 2015

O que existe entre o underground e o mainstream?

Tem três visões bem definidas a cerca dos padrões mercadológicos das bandas de rock, até mesmo em nível mundial. Mesmo nesta atual era onde praticamente não se vende mais discos, artistas consagrados mantém suas carreiras em padrões milionários por conta de grandes shows lotados e pela presença constante nas grandes mídias. Nomes como AC/DC, Metallica, Paul McCartney, Iron Maiden, Rolling Stones, Kiss, U2, Pearl Jam,  Roger Waters e alguns outros afortunados arrastam milhões de pessoas para suas apresentações, dos mais variados níveis de faixas etárias. Além disso, não é raro nos depararmos com suas apresentações em canais de televisão (mesmo em TV Aberta). E não tem muitos problemas para se acertarem com gravadoras.

Do outro lado da moeda existe o que chamamos de cena underground. Bandas que normalmente não recebem um centavo para mostrar seu trabalho ao público. Gravam e produzem seus shows por conta própria. Fazem por amor e muitas vezes sem nenhuma expectativa de se estabelecerem em padrões profissionais da música. Não raramente se escorando na ideologia para manter sua arte. Bandas de metal extremo (thrash, death, black metal) ou punk/hardcore ou até mesmo de white metal, tocando em festivais religiosos. Tais artistas dificilmente conseguem contratos com algum selo (mesmo que minúsculo) ou com renomados produtores e agentes de shows.

E ainda poderíamos citar o mercado das bandas cover, que reproduzem músicas de artistas consagrados, tocando na noite (em bares ou casas de shows) em troca de cachês irrisórios, mas ainda assim tendo satisfação por executar temas que gostam e se fazerem conhecidos na cena local onde atual.

Mas como poderíamos classificar nomes como Angra, Dr. Sin, Ratos de Porão, Blues Etílicos, Cachorro Grande, Made in Brazil ou mesmo bandas gringas como Machine Head, Hammerfall, Deicide, Sonata Arctica e Destruction (para dar uma variada nos segmentos)? As vendas de seus álbuns são insignificantes perante os medalhões lá de cima. A assistência média de seus shows se situa na casa de 1.000 a 5.000 expectadores. Mas elas já estão há muito tempo longe do underground. Existe um padrão mínimo de produção de seus shows em termos de estrutura. E (salvo pouquíssimas exceções) nunca aparecem em canais de mídia de massa, apenas em veículos especializados (sites, revistas). Nem extremamente populares, nem underground. Seriam elas da classe média do mercado musical?  Ou poderíamos dividir o underground entre duas categorias: daqueles que recebem por sua música e daqueles que a executam por prazer e ideologia? Teríamos o underground pobre e o rico?

Fica a dica para reflexão, para aqueles que acompanham a cena contemporânea do rock, que vive em constante mutação, do ponto de vista mercadológico.